Joseph Comblin que preferiu ser chamado de José pelos brasileiros e carinhosamente padre Zé pelos pobres e leigos que tiveram o privilégio de sua presença e compartilharam ensinamentos para a construção de um mundo menos injusto, ou como ele mesmo dizia: “um mundo que faz referência ao Reino de Deus”.
Ontem pela manhã o mundo perdeu não somente um teólogo, mas um discípulo comprometido com a vida, e essa vida, tendo como base o seguimento de Jesus. Nasceu em Bruxelas no dia 22 de março de 1923. Foi ordenado sacerdote em 1947. Desde então construiu uma teologia que tem marcado os caminhos daqueles que desejam ser parecidos com o Cristo de Deus. Sua biografia é cheia de tensões e serenidades. Foi expulso e acolhido em países da America Latina. Lecionou em muitas universidades e seminários, entretanto, seu maior interesse era a formação de pessoas simples, as quais são vítimas desse sistema injusto, tanto na religião como na economia.
Comblin, foi um dos mais importantes e polêmicos teóricos da Teologia da Libertação. Polêmico apenas para aqueles que não refletem o seu papel cristão e trabalham para manter, às vezes inconscientemente, uma religião opressora e descompromissada com o povo. No entanto, para os leigos e pobres, os que entenderam a Teologia da Enxada, ele foi tão claro e transparente como as águas dos riachos teimosos do nordeste brasileiro que insistem em jorrar para promover a vida.
É complicado definir esse grande homem em palavras. Porém, é fácil observar sua vida e vê quem era esse diferente sacerdote que a Igreja queria abafar a voz. Sabemos que agora ele será homenageado e reconhecido, pois temos esse grande defeito, somente depois da morte damos valor a quem tem valor. Diante de tão grandiosa vida fiquei sem saber o que falar da sua biografia. Por algumas vezes tive a oportunidade de passar um final de semana entre pessoas simples do interior da Paraíba tendo o padre Zé como um facilitador e mestre para a reflexão teológica. Um doutor que preferia ensinar os leigos ao invés de estar em alguns seminários que, segundo ele, não tem compromisso com o Reino de Deus e sim com o sistema capitalista. Por conta dos meus encontros com Comblin, o pastor Marcos Monteiro, (brincando ou será que foi sério?) falou que não posso morrer de qualquer jeito. Ele tem razão! Quem conviveu ou teve momentos com esse Zé não tem como achar que as coisas são assim mesmo. Que a injustiça é normal e a tradição é incólume, mas devemos pensar o contrário, que a Palavra de Deus, Jesus Cristo, é o único seguimento que temos para uma transformação social e religiosa.
O legado de Comblin é incomensurável. Muitos livros e palavras de transformação e de conhecimento sobre quem de fato é Jesus. Em um dos seus livros ele disse que no mundo atual precisamos ser capazes de expressar o que Jesus veio trazer ao mundo. “Se ele veio convocar a humanidade para seguir o seu caminho, importa – em primeiro lugar – saber exatamente qual é esse caminho que devemos seguir e mostrar. A religião virá depois, de acordo com a cultura de cada povo”. Ainda disse mais:
“O profeta é a pessoa que ainda tem fé quando a fé de todos enfraqueceu”.
José Comblin, 88 anos de serviço e dedicação aos povos da América Latina. Que sua vida e ensinamentos possam inspirar teólogos e teólogas, leigos e leigas, ou melhor, discípulos e discípulas de Cristo para a continuidade da luta contra a pobreza e o enfraquecimento espiritual que o mundo sem Deus vem mantendo ao longo da história.
Fábio Porto