quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Profeta nordestino: de sandália de couro e Bíblia na mão.

Feliz Aniversário Marcos Monteiro.
 
Profeta nordestino: de sandália de couro e Bíblia na mão.

Fiquei extremamente feliz e lisonjeado em participar desse momento de homenagens a esse que é simplesmente: Marcos Monteiro. O que falar de uma pessoa que ao meu ponto de vista encontrou o caminho proposto por Jesus, o Cristo de Deus. Esse camarada escreve bem, fala bem, é inteligente, solidário, teólogo, filósofo, discípulo, pensador e acima de tudo, um amigo, que nos ensina através do contexto da amizade que deveremos ser garimpeiros da humanidade no humano.

Difícil é falar desse nordestino sexagenário, porém vou arriscar algumas palavras que tentam dizer de Marcos Monteiro e da parte de minha vida onde ele ajudou a resignificar, construir, destruir, crescer, diminuir, chorar, sorrir, morrer, viver... Enfim, ele faz parte de uma das melhores fases da minha existência.

Sempre em minha caminhada cristã tive dificuldades de entender a vontade de Deus. As religiões sempre tentam decodificar essa vontade àqueles que são os seus adeptos. Entre idas e vindas na vida cristã chego em 2004 ao Seminário Teológico Batista do Nordeste, STBNe em Feira de Santana.

Em meio ao emaranhado de sonhos, medos, incertezas e perspectivas para essa nova etapa de minha vida, incluindo o cumprimento e/ou o aprendizado da vocação, conheço um pastor, filósofo, amigo, enigmático com sua sandália de couro e uma perspectiva utópica (no sentido de não lugar) do Reino de Deus. Onde o mais precioso dos valores humanos, uma vida de e com dignidade, não a sobrevivência a qualquer custo, faça parte dos nossos relacionamentos. Uma ambiência onde os participantes não são nem concorrentes nem objetos de uso e de consumo, mas irmãos e irmãs engajados na tarefa perene de construir vidas compartilhadas.  

Há algum tempo pensava que minhas dúvidas e questionamentos seriam resolvidos ao pisar o terreno daquela instituição. No entanto, e não sei ainda o porquê, fui parar em uma lecção onde Marcos Monteiro estava falando sobre o Outro do Outro do Outro. Pronto! A partir daquele momento meus dias de paz teológica acabaram. Pois ao invés de respostas, que em muitos casos são insuficientes, fui levado por um desses Outro, onde com todo respeito aos defensores da sistemática incluí Marcos, ao mundo fantástico das perguntas. Se não bastasse pensar no Outro incomensurável, no Outro incompreendido e no Outro complexo, ainda me aparece um ‘outro’ (Marcos Monteiro) nos convocando à difícil, mas apaixonante, tarefa de pensar nesses Outros a fim de que encontremos a melhor maneira de Outrar, viver a alteridade.

Na sala de aula, no Portal da Vida, nos congressos, nas lecções, nos debates, nos momentos comensais (onde aprendi que existe também uma teologia da cozinha), na comunidade de Jesus, dentre outros ambientes, descobri que esse não lugar que tanto queimava meu coração se tornara uma realidade. Viver um Evangelho encarnado faz parte da práxis desse homem. Sua lucidez é incrível. Em uma das suas falas no seminário sobre pastoral urbana ele disse que temos muitas coisas para fazer na construção de um mundo mais justo, igual, fraterno e solidário, e que não deveríamos pegar seus questionamentos sobre o uso da gravata e seus significados por exemplos, e fazer desse assunto um foco onde gastaríamos muita energia, pois essa era uma dificuldade sua e que nós deveremos buscar o caminho que desse sentido a nossa vocação. Lembrando Raul Seixas: "passei a vida inteira brigando com os galhos, quando na verdade o problema estava no tronco".

Certo dia ao perguntar a Marcos se a explicação de um querido professor do STBNe, que também tinha ouvido a mensagem o Outro do Outro do Outro, estava correta, ele me disse que gostaria que esse professor fosse explicar pra ele também, pois nem ele tinha entendido direito. O momento hilário serviu para me mostrar que o aprendizado se dá no caminho. A sabedoria está no fato de aprender sempre, mesmo que se aprenda o que se sabe e assim partir para um novo aprendizado.

Agradeço ao Pai por nos proporcionar vivências com pessoas comprometidas com a vida e com o sentido que ela deve ter no processo de superação das vicissitudes humanas. Marcos Monteiro é uma dessas pessoas iluminadas que habitam esse mundo complexo. Só uma coisa no meu convívio com Marcos me deixou triste, porém desafiado, ele me disse que não tenho mais o direito de morrer de qualquer jeito, pois quem conheceu José Comblin e a sua teologia da enxada pessoalmente, participou de retiros e congressos, deverá ser, no mínimo, assassinado pelos opositores da vida. Oxalá que não seja uma profecia!

Sigo meu caminho, algumas vezes como um jumentinho na avenida, outras como Paranísio da Vila Maravila com seu incurável otimismo sonhando com o dia em que o AGÁ seja acrescentado e tenhamos a Vila Maravilha socialista de vergonha. No entanto, nessa parte da minha vida chamada Marcos Monteiro, aprendi a sonhar e a caminhar na direção da construção de um mundo onde a ética e os valores do Reino de Deus apresentados no Sermão do Monte sejam uma realidade.

Que o Pai continue a abençoar esse profeta nordestino, de sandália de couro e Bíblia na mão, às vezes incompreendido, outras vezes compreensível, e em todas elas amável.

 Fábio Porto